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1 - Cemitério de Bojuru.
Eu estava passando uns dias na casa
de uma amiga em Balneário Quintão no município de
Palmares do Sul, estado do Rio Grande do Sul, Brasil. É
um lugar simples, mas acolhedor. A praia do local é de
mar aberto, fria, cor marrom e extensa faixa de areia.
Havia se passado cerca de duas semanas hospedado lá
quando um amigo que tinha se mudado recentemente para a
cidade de São José do Norte, no mesmo estado,
convidou-me a passar uns dias na casa dele. Resolvi ir e
planejei ficar lá por dois dias, retornando depois à
casa da minha amiga.
No dia 2 de outubro de 2024 saí de
Balneário Quintão por volta das 14h30 iniciando uma
viagem que duraria quatro horas. Minha amiga deu-me um
vaso com flores para deixar na sepultura do seu pai que
ficava no cemitério da Vila Bojuru, às margens da
estrada BR101. O trecho dessa longa estrada que iria
percorrer tinha um apelido sombrio: Estrada do Inferno.
Era assim chamado por suas péssimas condições durante
muitos anos, com trechos de areia, lama e grandes poças
d’água que tornavam a travessia extremamente difícil e
perigosa. Atualmente está asfaltada.
Ela também me deu um papel com o nome
do pai anotado, explicando-me onde o túmulo estava
localizado e pediu que eu fizesse uma breve oração por
ele. Naquele mesmo dia, aconteceria um eclipse solar
parcial visível no hemisfério sul, e, lembrando disso,
levei comigo os óculos especiais que havia comprado
justamente para observar o fenômeno durante a viagem.
Quando já tinha se passado das 17:30
estava me aproximando da Vila Bojuru. Diminui a
velocidade do carro para localizar o cemitério que
ficava um pouco para dentro do acostamento da estrada.
Decidi que deixaria o vaso de flores na sepultura para
depois observar o eclipse que deveria estar se
aproximando do seu ponto máximo naquele momento.
Ao chegar, encontrei duas moças em
uma moto na entrada do cemitério. Cumprimentei-as e
estacionei o carro. Elas me olharam de forma estranha —
como se estivessem esperando por alguém e, ao me verem,
pensaram que eu era quem esperavam. Foi uma impressão
momentânea, à qual não dei muita importância. Peguei o
vaso de flores e saí do carro. As moças seguiram em
direção à estrada.
O portão do cemitério estava aberto e
entrei, procurando a sepultura. Com base nas indicações
que recebi, fui observando os nomes nas lápides até
encontrar o local onde ele descansava. Depositei o vaso
ao lado do nome, onde havia também o retrato dele
protegido por vidro. Olhei o relógio: eram quase 17:49.
Lembrei-me do eclipse e decidi não demorar ali. Olhei
para baixo e fechei os olhos para fazer uma breve
oração. Segundos depois, instintivamente, abri os olhos
e percebi um ponto vermelho na superfície do vidro do
retrato. Pensei que fosse uma mancha de sangue e, na
intenção de retirá-la, abaixei-me e esfreguei o dedo
indicador. Nesse momento, senti uma forte tonteira e
minha visão ficou turva. Fiquei de olhos fechados por
alguns segundos, na expectativa que logo passasse aquele
desconforto. Ao levantar a cabeça devagar, tomei um
susto.
Um homem de cerca de 40 anos, com
poucos cabelos e altura entre 1,70 m e 1,80 m, me
observava a cerca de três metros de distância. Usava
calça jeans justa e, por cima da camiseta, uma jaqueta
de couro. Estava parado diante de uma lápide ornamentada
com um anjo de braços abertos, segurando uma espada em
uma mão e na outra um livro, possivelmente uma bíblia.
Olhei ao redor para ver se havia mais
alguém, mas apenas nós dois estávamos ali. Após alguns
segundos, cumprimentei-o: “Boa tarde!”. Senti que ele se
surpreendeu ao me ouvir. A expressão em seu rosto
denunciava um leve espanto, como se não esperasse que eu
o notasse. Pensei, por um instante, que talvez ele não
fosse deste mundo — talvez um espírito de alguém
sepultado ali. Nunca havia vivido uma experiência como
essa, e isso me deixou inquieto. Senti o coração
acelerar. Uma vontade repentina de correr até o carro e
deixar aquele lugar o mais rápido possível passou pela
minha mente. Mas foi tudo tão rápido que nem tive tempo
de agir quando ele disse: “Não tenha medo. Eu não estou
morto!”
Ao ouvir isso, senti um alívio. Sorri
para ele. Em seguida, ele perguntou: “Vi que você chegou
de carro. Para onde está indo?” Respondi que estava a
caminho de São José do Norte. Já deveria passar das
17:50 e eu nem lembrava mais do eclipse. Meu único
pensamento era voltar logo à estrada, pois ainda restava
cerca de uma hora de viagem. Comecei a me dirigir ao
portão do cemitério, quando ele me perguntou: “Você
poderia me dar uma carona até lá?” Estava começando a
escurecer e aquela região é um tanto deserta. Não tive
coragem de recusar o pedido e respondi que sim, que
poderia levá-lo.
Ele se aproximou e seguimos em
direção ao meu carro. No caminho, perguntou meu nome.
Foi quando percebi que ele falava com um sotaque de
Portugal, algo que eu não havia notado antes. Respondi:
“Helios”. Entramos no carro e partimos. Logo alcançamos
a estrada, que ficava a cerca de cem metros do
cemitério. Uns três minutos depois, quebrei o silêncio e
perguntei: “Você não é brasileiro? Fala com sotaque de
Portugal...”. Olhando fixamente para a estrada, ele
respondeu: “Sou europeu, mas não português. Aprendi
cinco idiomas por exigência do meu trabalho.” Fiquei
curioso para saber com o que ele trabalhava, mas temi
estar sendo indiscreto e preferi não perguntar. Poucos
minutos depois, olhei para ele e vi que estava com os
olhos fechados, provavelmente dormindo. Suas mãos
repousavam sobre as coxas, com as palmas voltadas para
baixo. Chamou-me a atenção o anel no dedo médio da mão
direita, com uma pedra vermelha. Ele tinha um aspecto
meio robótico, talvez por estar cansado, pois falava
pausadamente.
A viagem seguiu tranquila por cerca
de trinta minutos. Durante o percurso, vi cerca de três
placas ao longo da estrada informando que estávamos a 7
km de Santo Antônio dos Ventos, com intervalos de cinco
a dez minutos entre uma e outra. Nunca tinha ouvido
falar dessa cidade, porém o mais estranho foi perceber
que, à beira da estrada, havia algumas pessoas
maltrapilhas, parecendo mendigos. Algumas pediam carona
com gestos, enquanto outras estendiam as mãos pedindo
esmolas. Naturalmente, não parei — já estava escuro e
aquela cena era um tanto assustadora.
Em determinado momento da viagem, fui
obrigado a reduzir a velocidade, pois vinha, no sentido
contrário, na outra pista, uma procissão. Estendendo-se
por cerca de vinte metros, aquelas pessoas lembravam
monges, vestindo túnicas rústicas de cor marrom. Todos
usavam capuz, de modo que não era possível ver seus
rostos. Caminhavam lentamente, cada um segurando uma
vela acesa.
Assim que a procissão passou, o
misterioso passageiro acordou com um sobressalto e
exclamou: “Eu não poderia ter dormido. Poderia não estar
aqui!” Não compreendi o que ele quis dizer. Seus olhos
estavam fixos na estrada, como se estivesse hipnotizado
pela escuridão, onde apenas algumas luzes das casas
próximas se destacavam. Tentei retomar a conversa
perguntando: “Ainda não sei seu nome.” Ele me olhou e
respondeu: “John.”
Pensei que, se ele disse que era
europeu e seu nome sendo John, então a conclusão lógica
era de que fosse inglês. Então, comentei: “Ah, então
você é do Reino Unido?” Ele sorriu, como se
compreendesse a obviedade do meu raciocínio, e
esclareceu: “Não. Meus pais eram britânicos, mas eu não
nasci no Reino Unido.” Fez uma pausa e, depois de
suspirar, completou: “Você não conhece o país onde
nasci.” Houve mais uma pausa, como se ele estivesse
organizando os pensamentos antes de prosseguir. Olhou-me
novamente e disse: “Helios, não se espante com o que vou
te contar, mas eu não sou do seu mundo.”
Não esperei que continuasse e,
olhando para ele, exclamei: “O quê? Você está morto!?
Como pode, se eu vejo você aqui ao meu lado, fisicamente
e bem real?” Ele me interrompeu e, com firmeza, falou:
“Helios, preste atenção na estrada e apenas escute o que
vou lhe dizer:”
“Sou militar, naturalizado americano
e trabalho para FBI e CIA como agente especial de
controle da mente. Minha especialidade é extração e
inserção de ideias na consciência humana através dos
sonhos, algo que parece filme de ficção científica, mas
que já é uma realidade de onde eu venho e ajudamos seu
mundo dessa forma.
“Atuamos na mente de cientistas e
inventores de modo a auxiliá-los a fazerem novas
descobertas e desenvolverem ideias revolucionárias. Por
exemplo, eu recebi a missão de inserir ideias e
conceitos na mente de Satoshi Nakamoto que ajudaram ele
a desenvolver o Bitcoin.
“Atualmente, faço parte de um
experimento mental desenvolvido pela Neuralink. Não é a
Neuralink do seu mundo, mas do futuro em um universo
paralelo ao seu. Para ser claro e objetivo, quero dizer
que eu não sou do seu mundo. Venho de uma dimensão
paralela, uma outra realidade que você desconhece.
Quando eu disse que você não conhecia o país onde nasci,
é porque esse país não existe no seu mundo, mas existe
no meu. Talvez você esteja pensando que sou um louco
tentando brincar com você, mas não. Venho do futuro de
um universo paralelo ao seu. Os pesquisadores da
Neuralink descobriram uma forma de viajar no tempo e
retornar ao passado. Contudo, nesse tipo de experimento
não voltei ao passado do meu universo, mas sim em um
universo paralelo ao nosso, esse em que estamos.
“Os cientistas do seu mundo afirmam
não ser possível voltar ao passado porque não existem
viajantes do tempo entre vocês e porque seria impossível
que alguém retrocedesse e alterasse a própria história.
Refiro-me ao paradoxo do avô. Esse paradoxo, na verdade,
não existe porque a viagem ao passado ocorre em outra
realidade. Por razões que ainda desconhecemos, meu
universo está conectado ao seu de forma um pouco mais
próxima em relação aos outros multiversos. As evidências
indicam que existem muitos universos paralelos e todos
estão interligados. Se eu quisesse voltar ao passado e
matar meu avô, isso aconteceria em outro universo, não
no meu. Nesse caso, eu não nasceria nesse universo
alternativo, mas continuaria existindo no meu universo.
“O teletransporte entre multiversos é
muito perigoso. Porque não se sabe com precisão onde a
mente irá se materializar. Pode acontecer em uma rodovia
movimentada, no meio da floresta amazônica ou na cratera
de algum vulcão em atividade. Outra possibilidade é a
materialização em universos intermediários, interfaces
entre dois universos paralelos.
“A viagem no tempo de forma
planejada, controlada e intencional não é uma tarefa
simples. O processo de transposição temporal e espacial
que ocorre com mais facilidade é aquele em que a mente
viaja — e não o corpo. Esse é exatamente o processo que
estou vivenciando neste momento. Meu corpo está em um
laboratório da Neuralink, com vários chips conectados ao
meu cérebro, quase trezentos anos à frente do ano em que
você se encontra. Você me vê fisicamente, mas, na
verdade, é apenas minha consciência que se materializou
nesta dimensão.
“Nossas pesquisas indicam que o
teletransporte mental entre multiversos está
fundamentado na premissa de que a mente humana não é um
subproduto bioquímico do cérebro. Em vez disso, ela
interage com o corpo biológico por meio de um campo
sutil de informação quântica, que atua como interface
entre a consciência e a dimensão física. Com base nessa
perspectiva, a mente seria capaz de transcender
universos paralelos, realizando saltos de consciência
entre diferentes realidades. Esse fenômeno — o
teletransporte mental entre multiversos — pressupõe que,
ao atingir certos estados quânticos específicos, a
consciência pode colapsar sua presença em um universo e
se manifestar em outra realidade paralela.
Em 14 de abril de 1561, uma
experiência de teletransporte realizada em outro
universo paralelo não foi bem sucedida e só produziu
efeitos luminosos no céu da cidade de Nuremberg. Porém,
quase três séculos depois, os físicos daquela realidade
paralela obtiveram êxito e conseguiram teletransportar
um homem, cuja mente materializou-se no seu universo em
07 de agosto de 1850, na cidade de Lebus, também na
Alemanha, próximo à fronteira com a Polônia. O sucesso
da experiência somente foi possível devido a um eclipse
que ocorria naquele dia a 7.700 milhas do local da
materialização. Os eclipses provocam distorções no
espaço-tempo que facilitam o sucesso da experiência.
“Muitos dos fenômenos anômalos que
ocorrem no seu mundo, como esferas luminosas de energia,
agroglifos e outras aparições misteriosas para vocês,
identificadas como alienígenas, são tentativas de
contato realizadas a partir de algum universo paralelo
do futuro ou de multiversos de outros planetas.
“Em relação aos nossos universos,
observamos que eventos históricos de grande relevância
para a civilização humana são, em sua maioria,
idênticos. No entanto, certos detalhes são específicos
do meu mundo, assim como há particularidades exclusivas
do seu.
“Por exemplo, tanto no meu universo
quanto no seu, Hitler perdeu a guerra. O desfecho da
Segunda Guerra Mundial foi o mesmo com a vitória dos
Aliados e os ataques nucleares realizados pelos Estados
Unidos sobre o território japonês. Contudo, no seu
mundo, as cidades sacrificadas foram Hiroshima e
Nagasaki, mas no meu, foram Hiroshima e Kokura.
“A vitória dos Aliados faz parte da
história tanto do meu mundo quanto do seu, mas existem
universos paralelos onde Hitler não invadiu a União
Soviética em junho de 1941 e venceu a Segunda Guerra
Mundial. Há realidades alternativas em que a Segunda
Guerra nem sequer começou em 1939, pois Hitler morreu
durante a Primeira Guerra. No entanto, o conflito
mundial acabou ocorrendo décadas depois — e foi nuclear.
“Alguns fenômenos considerados
sobrenaturais existem porque vivemos em uma simulação
quântica, na qual há uma infinidade de universos
paralelos vibrando e conectados entre si. Essas conexões
ocorrem por meio de portais dimensionais microscópicos
no espaço-tempo, que chamamos de cordas cósmicas.
“Quando um portal microscópico se
forma exatamente no espaço-tempo onde se encontra o
córtex pré-frontal de uma pessoa que possua determinadas
particularidades biológicas, ou se entra em contato com
algum ponto energético do corpo conectado de maneira
especial ao cérebro, sua mente é imediatamente sugada
para outro universo. Nessa condição, ela pode viver
experiências que, no outro universo parece durar horas
ou até dias, mas, quando a mente retorna ao corpo, terão
se passado apenas alguns segundos.
“Por alguma razão ainda desconhecida,
esses portais costumam se abrir com relativa frequência
em locais públicos fechados, como banheiros, elevadores,
túneis, estações de metrô, construções abandonadas ou
cavernas. Em ambientes abertos também é possível que
esses portais se formem, porém mais raramente.”
Fez uma pausa para recuperar o
fôlego, pois falava quase que automaticamente, como se
estivesse lendo um texto escrito. Depois, continuou:
“Eu faço parte da equipe que trabalha
neste projeto. Hoje é o segundo experimento que
realizamos com sucesso. No primeiro, conseguiram trazer
minha mente ao seu mundo exatamente 65 anos atrás. Fui
teletransportado para o Japão, mais especificamente para
um banheiro do Aeroporto de Haneda, onde o portal
dimensional se abriu. Isto foi em 2 de outubro de 1959 a
aproximadamente 7.700 milhas do eclipse solar que estava
acontecendo neste mesmo dia no continente africano.
“Por ser a primeira experiência
bem-sucedida, eu estava muito confuso. Se você pesquisar
na internet, encontrará registros desse episódio, que
passou a ser tratado como uma lenda urbana. Você também
descobrirá de qual país eu vim. Chama-se Taured e meu
nome é John Allen Kuchar Zegrus — mas prefiro que me
chame apenas de Zegrus.
“O que aconteceu nesse dia foi que os
agentes de segurança do aeroporto viram que eu tinha
dupla cidadania: americana e taurediana. Porém, julgaram
que o passaporte emitido por Taured era falso, visto que
eles nunca tinham ouvido falar em tal país. Por esse
motivo fui julgado e sentenciado a um ano de prisão por
ter entrado ilegalmente no Japão. Fui levado para a
Prisão de Fuchu, mas três dias depois retornei para meu
mundo. Meu desaparecimento não foi noticiado para a
imprensa pois a reputação da penitenciária seria muito
prejudicada.
“O experimento de hoje foi muito
arriscado, pois havia 95% de probabilidade de o portal
se abrir no meio do oceano. Isso porque, sabendo onde o
primeiro portal havia surgido, os cálculos indicavam que
a nova abertura ocorreria a 700 milhas a partir da
coordenada oposta (coordenada antípoda) da coordenada
inicial (Aeroporto de Haneda). Todavia, um fator
bastante favorável salvou a experiência, que foi o
eclipse. Como os pesquisadores haviam previsto, o
alinhamento ocorrido hoje entre Sol, Lua e Terra, criou
um efeito gravitacional que influenciou o espaço-tempo,
favorecendo a abertura do portal dimensional no
continente, exatamente a 700 milhas da coordenada
antípoda.”
Após todo esse relato, ele fez outra
pausa — talvez, imagino, na expectativa de saber qual
seria minha reação diante de tudo o que acabara de
contar. Eu estava tão estupefato naquele momento que só
consegui dizer que tudo aquilo era inacreditável. Ele
pareceu compreender minha perplexidade. Não consegui
dizer mais nada e, após um ou dois minutos de silêncio,
ele falou: “Helios, preciso da sua ajuda.”
Pensei de que forma eu poderia ajudar
um desconhecido que me revelava uma história tão
extraordinária, que ninguém acreditaria se eu contasse.
Ele olhou para o painel do carro e disse: “Vejo que está
com pouco combustível.”
De fato, o alerta indicando “reserva”
estava aceso — e eu nem sabia há quanto tempo estava
assim. Precisaria abastecer o mais rápido possível.
2 - Mais
Revelações
Disse a ele que estava preocupado com
o nível do combustível, mas não se passaram nem dois
minutos e logo chegamos a um local de abastecimento
chamado Posto Gibbon. Ao parar o carro ao lado da bomba,
notei algo estranho. O posto parecia envelhecido —
carros antigos, enferrujados e abandonados ocupavam o
estacionamento. As bombas de gasolina também estavam
enferrujadas. Embora fosse a minha primeira vez ali,
havia algo claramente anacrônico naquele lugar, como se
pertencesse a outra época — algo dos anos 60 ou, no
máximo, dos anos 70.
Um funcionário se aproximou com o
semblante visivelmente aborrecido e perguntou:
“O que você quer aqui?”
A resposta era óbvia, mas não me
perturbei com o modo indelicado como fui tratado.
Simplesmente pedi para completar o tanque. Quando
terminou, ele pegou o dinheiro e disse de forma seca:
“Já pode ir embora! Agora!”
Assim que entrei no carro, Zegrus
perguntou:
“Você pode parar ali no
estacionamento?”
Atendi ao pedido. Estacionei o carro
e desliguei o motor, imaginando que ele ainda tinha algo
importante para me dizer.
Nesse instante, um homem apareceu ao
lado do carro e ficou nos observando com uma expressão
de raiva. Seus olhos eram vermelhos, como os de um
drogado.
Fiquei inquieto, mas Zegrus parecia
não se importar. Agia com naturalidade, como se aquele
estranho nos observando fosse algo corriqueiro. O homem,
no entanto, não permaneceu por muito tempo e logo se
afastou, caminhando em direção a uma mata que havia
atrás do posto.
Zegrus olhou para mim e disse:
“Helios, vou explicar o motivo de eu
estar aqui. Em janeiro deste ano, fizemos contato com
duas moças da cidade de São José do Norte. Elas foram
escolhidas para que eu lhes transmitisse uma missão.
Apesar dos cientistas da Neuralink conseguirem me
teletransportar até o cemitério onde nos encontramos, eu
não consegui vê-las.
“Dias atrás, fizemos outro contato
com elas e tentamos um novo encontro no mesmo local.
Esse encontro seria hoje, pois, como lhe disse, o
eclipse favoreceria tanto a abertura do portal em terra
firme quanto a possibilidade de eu vê-las e elas a mim.
“No entanto, por conta de um atraso
no experimento, não consegui chegar no horário combinado
e suponho que elas já tenham ido embora. Dessa forma, é
a você, e não a elas, que preciso confiar a missão.”
Olhei para fora e suspirei, temendo
qual seria a missão que ele me confiaria. Voltando o
olhar para ele, disse:
“Bem... Zegrus, se você deixou seu
mundo no futuro para vir até aqui encontrar alguém
disposto a aceitar uma missão, então ela deve ser
realmente muito importante. Diga-me: que tarefa tão
relevante você pretende me entregar?”
“Antes, preciso contar um pouco sobre
o país de onde vim: a República de Taured. No seu mundo,
essa república não existe porque no mesmo território,
encontra-se o Principado de Andorra. No meu mundo,
Taured também é conhecido como a República dos Lords e
vou lhe explicar o porquê.
“Em 1307, o rei Filipe IV da França
iniciou uma perseguição contra os cavaleiros templários
em seu território. Na Inglaterra, ao tomarem
conhecimento dos acontecimentos, a maioria dos
templários decidiu fugir com todos os bens da ordem,
temendo que o rei Eduardo II também tivesse a mesma
atitude. Cerca de 70 cavaleiros deixaram a ilha
britânica ao longo de um mês.
“O destino planejado era Portugal,
pois sabiam que lá teriam a proteção do rei Dom Dinis I.
No entanto, ao chegarem aos Pirineus, hospedaram-se no
mosteiro da Ordem de Santiago de Altopascio — uma ordem
militar, como os templários, mas que também prestava
assistência aos peregrinos cristãos. Seus integrantes
eram conhecidos como os Cavaleiros do Tau, cujo símbolo
era a cruz grega tau. Os templários ingleses foram
recebidos como irmãos e, mudando seus planos iniciais,
uma parte deles decidiu permanecer no mosteiro, onde
hoje fica a cidade de Andorra la Vella. A outra parte
seguiu para Portugal e anos depois integraram a Ordem de
Cristo, fundada por Dom Dinis.
“Ao longo das décadas seguintes, o
mosteiro transformou-se em um castelo, fortemente
influenciado pelos templários ingleses que haviam se
integrado aos Cavaleiros do Tau. Com a dissolução da
Ordem de Santiago de Altopascio em 1459 pelo Papa Pio
II, juntamente com outras cinco ordens religiosas, os
Cavaleiros do Tau declararam independência política e
administrativa do Vaticano, embora tenham mantido as
mesmas tradições religiosas da Igreja Católica. Assim,
teve início a fundação da Ordem Taured, que passou a ser
conhecida como a Ordem do Tau Vermelho, cuja bandeira
exibia uma cruz tau vermelha sobre fundo branco.
“Os cavaleiros tauredianos
tornaram-se extremamente influentes e poderosos em toda
a Europa. Em 1607, o rei Henrique IV da França
determinou que toda a região, fosse governada pelo
Grão-Mestre da Ordem Taured, que também detinha o título
de príncipe. Nascia assim, o Principado de Taured. A
cidade de Andorra la Vella foi transformada na capital
do principado e passou a se chamar simplesmente de
Andorra.
“Com o passar dos séculos, o
Principado de Taured tornou-se refúgio de muitos
europeus ricos, que participavam ativamente da vida
política e luxuosa do principado. Milionários e nobres
de todo o mundo construíram castelos e palácios,
transformando a região em um destino turístico e refúgio
de homens poderosos e influentes.
“Ainda hoje, milhões de turistas
visitam Taured anualmente. Vários castelos abrigam
cassinos luxuosos. O Grande Prêmio de Fórmula 1 mais
prestigiado no nosso mundo é o Taured Grand Prix,
disputado em um circuito sinuoso e de ultrapassagens
difíceis. No nosso multiverso, o Grand Slam de tênis é
composto por cinco torneios — os mesmos quatro do seu
mundo e o quinto é Taured Open.
“No início do século XX, a antiga
Ordem Taured foi transformada em um clube fechado
formado por homens muito ricos. Esse seleto grupo passou
a ser conhecido como Clube Taured, cujo presidente
passou a governar o principado. Se no seu mundo, existe
o Clube de Roma e o Clube Bilderberg, a elite global que
atua na nossa realidade paralela está reunida no Clube
Taured, também conhecido como o Clube dos Nobres do
Mundo. Para fazer parte deste clube a única condição é
possuir algum título de nobreza, seja de Taured ou de
outro país.
“Os títulos nobiliárquicos, de barão
a duque, em Taured são essencialmente honoríficos, ou
seja, não são acompanhados de concessões de terras ou
jurisdição territorial, mas poderiam ser vendidos ou
transferidos para um filho como herança. No final do
século XIX, Taured era a nação com maior número de
nobres, sendo o auge da era de ouro dos Lords.
“Após o fim da Segunda Guerra
Mundial, o Clube Taured abdicou do governo do país,
dando origem à República Unida de Taured — uma república
semipresidencialista, com sistema semelhante ao modelo
francês. O parlamento passou a ser composto por aqueles
que eram proprietários de castelos ou luxuosas mansões
em Taured. Cada um deles detinha algum título de nobreza
que o principado concedia, razão pela qual Taured passou
a ser conhecida como a República dos Lords ou Nação dos
Lords. As Ladys são minoria, mas também exercem
participação ativa no Parlamento de Taured. O presidente
da nação é escolhido entre os Lords do Parlamento e
ostenta o título de príncipe.
“No início da década de 1970, a elite
governante de Taured decidiu entregar a administração do
país a um grupo formado pelas maiores corporações
mundiais, para que governassem a nação como se fosse uma
grande empresa. Assim, foi criada uma corporação
encarregada de administrar Taured, com um conselho de
administração cujo presidente passou a ser o Chefe de
Estado. O Chefe de Governo, por sua vez, passou a ser um
CEO indicado por esse conselho, recebendo o título de
Primeiro Ministro. Com o sucesso desse novo modelo de
governança, vários países ao redor do mundo passaram a
adotar o mesmo sistema.
“Hoje, a inteligência artificial e a
robótica servem à população. No coração do governo há
uma super poderosa Inteligência Artificial Geral
Central, denominada Atlas, que gerencia e administra
todo país. O medo que vocês têm de serem dominados pela
IA ou da IA destruir o mundo foi resolvido com um
sistema de monitoramento da IA. Quando a IA envia um
comando para um robô, essa instrução passa antes pelo
filtro do Censor, que é um algoritmo que avalia se a
instrução oferece algum perigo. Caso positivo, o Censor
desliga o robô e uma central humana de controle da IA é
informada para tomar as ações necessárias. Ou seja,
todos dispositivos inteligentes não recebem diretamente
comando da IA Central, mas do Censor que antes de
repassar a informação avalia a segurança da instrução.
“Você deve estar pensando se a
inteligência artificial, a robótica e automação fazem o
trabalho humano, como as pessoas do futuro vivem se não
precisam mais trabalhar? Pois eu lhe digo, não
trabalham, mas também não vivem ociosos, até porque a
expectativa de vida no futuro é de 170 anos. Com a
garantia da renda básica universal, a vida estressante
dos tempos antigos acabou quando IA e robôs passaram a
realizar o trabalho das pessoas. Então, o que se faz?
Primeiro, todos se ajudam. Não existe solidão, tristeza
ou desamparo. O mundo todo é uma grande família, baseada
no respeito e na solidariedade. Depois, as pessoas fazem
o que gostam: todo tipo de esporte, arte, estudos,
pesquisas científicas, etc. Todos cultivam uma vida
espiritual permanente, fazendo da meditação, oração e
devoção religiosa parte fundamental da rotina diária.
Muitos exercitam autoconhecimento e autodisciplina, além
de desenvolverem capacidades extra sensoriais, como
viagem fora do corpo, clarividência, telepatia,
premonição, psicometria, bilocação, canalização e...
viagem ao passado através da tecnologia.
“A Neuralink está desenvolvendo o
Chronochip para se fazer visitas ao passado ou a outros
universos, disponível para qualquer pessoa. Eu estou
aqui, mas o processo a que estou sendo submetido é
diferente e ariscado. Como disse, eu poderia ter me
materializado no oceano, mas minha mente foi treinada
caso isso acontecesse, o que seria traumático para um
viajante que não estivesse preparado para a experiência
quando retornasse ao universo de origem.
“Todavia, com esse chip especial os
pesquisadores encontraram uma forma da mente visitar o
passado do próprio universo, mas sem adentrar na
dimensão do universo. Ela fica invisível numa região
específica só assistindo os acontecimentos, sem
interação com quem está vivendo aquele mundo.
“Aliás, a mais famosa experiência bem
sucedida do projeto retrocedeu no tempo até 2009 na
Universidade de Cambridge, no dia que o famoso
astrofísico Stephen Hawking organizou uma festa para
viajantes do tempo. Hawking concluiu que a viagem não
seria possível porque ninguém do futuro apareceu na
festa, mas o que ele não sabia é que a sala estava
repleta de cientistas e pesquisadores da Neuralink e de
outras universidades americanas, colaboradoras do
projeto. Os viajantes do futuro foram à festa, mas
estavam em outra dimensão, invisíveis aos olhos de
Hawking.”
Fez uma pausa e, após um longo
suspiro — como se buscasse recuperar energia —
prosseguiu:
“Antes de continuar falando sobre meu
mundo, preciso abrir um parêntese a respeito do seu.
Atualmente, vocês atravessam um momento extremamente
crítico. Estou ciente disso porque o nosso mundo também
passou por essa situação. Refiro-me à ameaça da Terceira
Guerra Mundial e à possível devastação nuclear do
hemisfério norte. Esse cenário é apavorante e uma das
razões pelas quais vim do futuro foi justamente para
alertá-los desse perigo real.
“Além da destruição nuclear provocada
por decisões equivocadas de líderes mundiais, existe
também o risco de catástrofes naturais e climáticas de
proporções apocalípticas a nível de extinção em massa.
Uma inversão abrupta e inesperada dos polos magnéticos
da Terra, a erupção colossal de um supervulcão ou o
impacto de um meteoro de grande proporção.
“Contudo, colonizar Marte não deve
ser encarado como a solução definitiva para garantir a
sobrevivência da raça humana. Não há dúvidas que é
importante para o desenvolvimento científico e
tecnológico da humanidade, porém, o mais urgente é
salvar o próprio planeta, que é um paraíso se comparado
com Marte. Nós conseguimos e vocês também conseguirão.
“No nosso universo, a SpaceX liderou
o processo de colonização de Marte. Porém, os humanos
que nasceram no planeta vermelho, após algumas décadas
passaram a apresentar diferenças físicas em relação aos
terráqueos, devido às condições ambientais únicas de
Marte. Essas diferenças são tanto visuais quanto
biológicas, o que torna fácil distinguir um marciano de
um terrestre.
Atualmente, há um grande movimento de
emancipação em curso, já que os habitantes de Marte se
identificam mais como marcianos do que humanos
descendentes dos colonizadores da Terra.”
Fez breve interrupção e olhou para
fora. Parecia refletir se deveria continuar com as
revelações, mas continuou:
“A contribuição de Elon Musk para o
desenvolvimento tecnológico da humanidade é da mais alta
importância. O mundo deve muito a ele, especialmente por
sua maior contribuição à humanidade: o uso da
eletricidade... ou melhor, pela invenção do motor de
indução de corrente alternada.”
Nesse momento, ele fez outra pausa
mais prolongada e aparentemente proposital, como se
aguardasse minha reação àquela afirmação.
De fato, fiquei surpreso e exclamei:
“Como assim? Elon Musk inventou o motor de corrente
alternada?”
Sorrindo, compreendendo meu espanto,
respondeu com ênfase: “Não exatamente. Quero dizer que
Elon Musk é a reencarnação de Nikola Tesla, meu
amigo...”
Estava maravilhado com tantas
revelações extraordinárias vindas daquele viajante de
outro universo. Queria saber mais e perguntei:
“Que outra personalidade histórica do
passado você conhece e que está presente no nosso mundo
atual?”
Notei que ele hesitou, relutando em
se aprofundar no assunto. Mas, por fim, acabou cedendo:
“Bem, não gostaria de entrar muito
nesse assunto porque são informações que não podem ser
comprovadas. Mas só para satisfazer sua curiosidade, vou
revelar outro famoso do Vale do Silício: Sam Altman...
ele é a reencarnação de Alan Turing. E Napoleão
Bonaparte, que aterrorizou a Europa no início do século
XIX, hoje é motivo de grande preocupação entre os
líderes europeus através da sua reencarnação como
Vladimir Putin.
"Talvez você duvide, mas acreditar ou
não no que estou lhe dizendo não altera a realidade dos
fatos. No passado, muitos acreditavam que a Terra fosse
plana, mas, apesar dessa crença generalizada, jamais o
planeta foi plano. As coisas são como são e não como
acreditamos ser. Não há dogma religioso que mude isso.
Um dia, o retorno da consciência humana ao mundo em
outro corpo será comprovado através de pesquisas
científicas com uso da inteligência artificial e da
computação quântica. Por enquanto, a reencarnação
permanece apenas no âmbito das possibilidades, do crer
ou não crer."
Eu não tinha palavras para expressar
minha surpresa com o volume de revelações. Olhei para
frente e avistei uma quadra de esportes ao lado do posto
de gasolina. Três crianças jogavam futebol dentro da
quadra. Refleti por alguns instantes sobre o contraste
da situação - enquanto eu recebia revelações grandiosas
e informações desconhecidas sobre o nosso mundo, aqueles
garotos brincavam despreocupadamente, alheios a tudo.
Zegrus também permaneceu quieto,
observando as crianças. Então, quebrei o silêncio e
perguntei: “Entendi tudo o que você contou... mas você
disse que precisava da minha ajuda. De que forma posso
ajudar?”
Ele não respondeu de imediato. Pensou
por alguns segundos antes de falar:
“Tenho um projeto especial para você
iniciar. Taured não existe no seu mundo. Precisamos que
você estabeleça um país com as mesmas características de
governança da nossa Taured — uma nação inovadora, que
desafiou as convenções tradicionais de governo e
redefiniu o conceito de Estado.
“Sua missão é iniciar a fundação de
um país, um Estado Soberano, no mesmo modelo de Taured.
Governado por uma corporação empresarial que
administrará toda nação e cuja estrutura e hierarquia
serão de especialistas e não de políticos. Deve ser um
sistema tecnocrático por excelência, um exemplo de
eficiência para os governos de outras nações, cujo
objetivo final será sempre o bem da população. Estaremos
enviando insights mentais com instruções e sugestões e
guiando você até a completa realização da missão.”
Fez uma pausa, aguardando minha
resposta. Sentia-me confuso e inseguro para dizer
qualquer coisa naquele momento. Tentando quebrar o
silêncio — e na esperança de que ele me desse argumentos
convincentes para aceitar o convite, falei:
“Não estou certo de que serei
bem-sucedido nesse projeto. Para estar à frente de algo
tão ambicioso, são necessárias muitas qualidades, como
liderança, comunicabilidade... e eu não as possuo. Sou
tímido, não gosto de aparecer em público, não tenho rede
social, não gosto de aparecer em fotos ou vídeos, não
tenho curso superior... enfim, não me sinto preparado
para liderar um projeto de construção de uma nação.”
Zegrus sorriu enigmaticamente e
respondeu com voz serena, mas firme: “Não é o homem
preparado que constrói uma nação, mas aquele que tem
coragem de dar o primeiro passo. Grandes líderes do
passado também eram tímidos, inseguros e, em muitos
casos, sem uma educação acadêmica. A liderança não vem
de títulos ou de discursos eloquentes. Ela nasce da
visão, da resiliência e do desejo genuíno de construir
algo maior para a sociedade.”
Eu ainda estava hesitante, apesar da
convicção que suas palavras transmitiam. Olhei para ele
e indaguei: “Mas por que eu? Há tantas pessoas mais
qualificadas, mais confiantes, mais aptas para liderar.
Eu não entendo porque você acredita que eu posso liderar
um projeto tão grandioso.”
Olhando fixamente em meus olhos,
respondeu de forma direta, sem rodeios: “Porque a Super
Inteligência que governa o Universo, que todos chamam de
Deus, escolheu você como uma das possibilidades de
contato. Se não tivéssemos esse encontro, eu teria outra
oportunidade de entregar a missão para outra pessoa em
outro portal dimensional que será aberto em 21 de
setembro de 2025. Será em algum ponto do Vaticano, por
influência do eclipse solar que estará acontecendo na
coordenada antípoda ao Vaticano neste dia, um ponto no
Oceano Pacífico Sul, a cerca de 1.400 quilômetros da
Nova Zelândia.
“A Santa Sé é um portal dimensional
de grande magnitude. Aliás, farei uma revelação e você
terá o privilégio de ser a primeira pessoa a conhecer.
Ninguém no mundo sabe, mas existe uma importante conexão
entre o Vaticano, Jerusalém e o Antigo Egito. Esta
conexão está representada pelo obelisco instalado na
Praça de São Pedro.
“Sob orientação espiritual, a
Basílica de São Pedro foi construída para ficar
exatamente a mesma distância do antigo Templo de
Jerusalém e da Tumba Real do Faraó Akhenaton. Traçando
uma linha reta partindo da basílica até o Domo da Rocha
no Monte do Templo e outra reta da basílica até a tumba
real do faraó, forma-se um triângulo que lembra o
obelisco instalado na Praça São Pedro. Os dois pontos
geográficos da base do triângulo estão a mesma distância
da Basílica de São Pedro e isso não é coincidência,
foram construídos nas posições em que estão para
transmitir uma mensagem no futuro.
“O obelisco, feito de granito
vermelho, é liso como a areia do deserto, isto é, não
possui hieróglifos gravados. Foi retirado do Egito pelo
imperador Calígula no ano 37 d.C. Séculos depois, o papa
Sisto V ordenou que fosse colocada no topo uma cruz
simbolizando a autoridade do cristianismo sobre as
outras religiões.
“O simbolismo oculto do obelisco
revela que o cristianismo está no alto, “nas nuvens”,
perto de Deus, enquanto as outras religiões estão na
base, sendo representadas pelo Monte do Templo, onde no
passado estava o Templo de Jerusalém e hoje está o Domo
da Rocha, e o túmulo de Akhenaton que foi o governante
egípcio que nos anos 1300 a.C. estabeleceu o culto a
Aton (Sol) como divindade única. O que existe em comum
entre as localizações geográficas da base do triângulo é
que elas representam o início, o fundamento da adoração
a uma única divindade, culminando no cristianismo.
Embora dividida, a religião cristã no futuro será uma
só, sem separação de dogmas ou fiéis.”
Eu estava profundamente impactado com
tanta informação que desconhecia e esteve oculta por
séculos do conhecimento humano. Refleti por alguns
instantes e apesar da confiança dele em mim, ainda
retruquei: “E se eu falhar? Se eu não corresponder à sua
expectativa?”
“Não falhará porque você terá apoio e
investimentos das pessoas certas. Elas acreditarão no
enorme potencial de obterem lucros espetaculares
investindo na criação de um país, que será um marco
histórico na transformação da humanidade.”
Por fim, concluiu: “Aceita a missão?”
Senti um misto de medo e esperança
como uma centelha acendendo dentro de mim. Respirei
fundo, sentindo o peso da minha decisão, mas também a
possibilidade de iniciar algo extraordinário. Então
respondi: “Sim, aceito a missão!”
Com um sorriso de satisfação no rosto
concluiu:
“Bem-vindo ao início da sua jornada!
Mas antes tenho uma recomendação importante. Não conte a
ninguém que esse nosso encontro realmente existiu. Tudo
que revelei hoje você dirá que é fruto da sua
imaginação, uma ficção que nasceu da sua mente. Porque,
acredite em mim, ninguém vai acreditar em você se disser
que esteve com um viajante do tempo. Pelo contrário,
questionarão e desacreditarão que esse encontro comigo
tenha realmente acontecido.
“A mente humana é curiosa e
desconfiada por natureza. Se você disser que encontrou
um homem de uma realidade paralela do futuro, a reação
será de ceticismo, piadas ou até hostilidade. Não
importa a origem da ideia, se de um viajante do tempo ou
se é fruto da sua imaginação, mas o impacto que ela terá
no mundo.”
Respirei fundo e sentindo o peso da
responsabilidade, mas com o espírito determinado, eu
disse: “Está bem, eu seguirei seu conselho. Vou manter
segredo da verdade e assumir a responsabilidade pela
concepção do projeto.”
Olhando ao redor do estacionamento,
Zegrus murmurou: “Onde será que fica o banheiro?”
Apontei para uma construção próxima,
nos fundos do posto, dizendo que parecia ser lá. Ele
agradeceu com um leve aceno de cabeça, saiu do carro e
caminhou na direção indicada. Fiquei ali, imóvel,
tentando organizar os pensamentos. Por mais absurda que
fosse aquela situação, havia algo no olhar dele que me
transmitia uma estranha sensação de confiança.
Os minutos começaram a passar e, aos
poucos, minha inquietação cresceu. Olhei para o relógio
no painel do carro: dez minutos haviam se passado. Ainda
no banheiro? — pensei.
Relaxei e continuei esperando. Eu
havia observado quando ele entrou e, com certeza, não o
vi sair. Mais dez minutos se passaram e tornei a me
inquietar.
Meia hora depois que ele saíra do
carro, meu desconforto se transformou em preocupação —
apesar de ter certeza de que ele não havia saído do
banheiro, pois estava observando a porta o tempo todo.
Ninguém entrou além dele e ninguém saiu.
Saí do carro, com o coração batendo
mais rápido do que eu gostaria de admitir. O lugar era
mal iluminado e caminhei devagar em direção ao banheiro.
Era uma pequena construção mal conservada, de tijolos
aparentes, com uma porta metálica na entrada. Ao me
aproximar, observei que o local era totalmente fechado,
sem janelas ou qualquer tipo de abertura para ventilação
ou exaustão.
As lâmpadas dos postes do
estacionamento não iluminavam a área ao redor do
banheiro, que permanecia mergulhada em penumbra. Na
porta, havia um cartaz com o retrato de três meninos,
entre 10 e 15 anos, acompanhado do título, em letras
grandes: “DESAPARECIDOS HÁ UM ANO. OS PAIS ESTÃO
DESESPERADOS PELOS FILHOS.” Abaixo das fotografias,
havia um telefone para contato.
Tive a nítida sensação de que aquelas
eram as mesmas crianças que vi brincando na quadra de
esportes. Olhei na direção da quadra — e lá estavam
elas, ainda jogando bola. Voltei a olhar para as fotos.
A sensação persistia. Mas eu precisava encontrar Zegrus.
Empurrei a porta com cuidado; ela
rangeu de maneira amedrontadora. Lá dentro, o ar era
pesado, úmido, e o som de uma torneira pingando ecoava
pelo espaço vazio.
“Zegrus?” — chamei. Minha voz saiu
baixa e hesitante. Total silêncio, nenhuma resposta.
Caminhei até os boxes das privadas.
Todas estavam com as portas entreabertas. Inspecionei
uma a uma, mas não havia ninguém ali. Nenhum sinal dele.
Fiquei intrigado. Durante todo o tempo, eu havia mantido
os olhos na porta do banheiro e ele não saíra.
Observei todas as paredes. Não havia
janelas, nem aberturas. A única saída possível seria
pela porta.
Foi então que notei um zumbido baixo.
A fraca iluminação do banheiro piscou três vezes e
comecei a me sentir desconfortável por ainda estar ali
dentro. Olhando em volta percebi que o zumbido vinha do
espelho. Aproximei-me e percebi um ponto luminoso
vermelho no espelho, semelhante ao de um laser usado por
professores para apontar instruções na lousa. O estranho
é que o ponto de luz parecia vir de dentro do espelho.
Virei-me, tentando identificar se haveria uma suposta
fonte de feixe de laser — mas não havia nada. Apenas uma
parede branca. Nada mais.
Curioso, toquei o ponto vermelho com
o dedo indicador. No mesmo instante, o espelho começou a
escurecer, até ficar completamente negro, como carvão.
Senti tudo ao meu redor girar. Fechei os olhos e me
apoiei com as mãos na pia. Permaneci imóvel por uns dois
minutos, tentando recuperar o equilíbrio, até que
comecei a abrir os olhos lentamente.
Tudo ao redor estava como antes,
exceto o ponto vermelho. O espelho estava normal, mas o
ponto vermelho desaparecera. A vertigem havia passado e
achei melhor sair daquele lugar o quanto antes. Mas ao
abrir a porta do banheiro fui surpreendido por uma
experiência extremamente surreal e inacreditável. |